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segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

ADRIANO MOREIRA - Um livro biográfico

"Adriano - Vida e obra de um grande português"




A sala estava cheia, convidados, população, grupo de escuteiros e coral da aldeia, com instrumentos entre os quais um oboé! Frio, um frio fim de tarde sem chuva. Dentro da sala estava abafado, da gente e de uns aquecedores de gás. Mas cumpriu-se a função, que acabou com vinho-do-porto para todos, enquanto o Professor e o autor do livro escreviam dedicatórias e autógrafos.

Palavras proferidas pelo autor deste blogue na apresentação do livro biográfico escrito por Manuel Vieira Pinto sobre o Professor Doutor Adriano Moreira em Grijó, Macedo de Cavaleiros, 11 de Dezembro de 2010:


Os livros biográficos têm, muitas vezes, um de dois defeitos ou os dois simultaneamente: um, o de transporem, para o passado dos visados, as nossas preocupações, polémicas e preconceitos e, outro, o de permitir que a imaginação de quem escreve faça afirmar, pela voz dos biografados ou na descrição dos factos vividos, mais do que os dados documentais permitiriam escrever (1). Não é o caso deste livro, Adriano - Vida e Obra de Um Grande Português, da autoria de Manuel Vieira Pinto(2). Não é um livro que nos transponha para o passado: pelo contrário, faz o passado vir ter connosco, com tudo o que de saboroso isso possa ter e tem e com tudo o que de importante isso possa permitir e permite. E se põe a imaginação a cumprir o seu papel, é porque a coloca no plano e na perspectiva do leitor, que a faz voar para os sucessivos quadros em que se desenrola a acção, a de uma vida real e tangível, preenchidíssima e riquíssima vida, e a coloca ao serviço de uma reconstituição fiel das linhas dessa mesma vida, passo a passo, ideia a ideia. Minhas senhoras e meus senhores: estamos perante um grande livro!

[Excelentíssimo Senhor Professor Doutor Adriano Moreira

Excelentíssimo Senhor Doutor Manuel Vieira Pinto

Excelentíssimo Senhor Dr. Duarte Moreno, Vice-Presidente da Câmara Municipal de Macedo de Cavaleiros

Excelentíssimo Senhor Presidente da Junta de Freguesia de Grijó, meu amigo Simão Ferreirinha

Excelentíssimo Senhor Daniel Gouveia, Editor

Minhas Senhoras e meus Senhores]

Devo dizer que não é menor a dificuldade de ter de me exprimir diante do autor e do biografado. Corro o risco de, ao querer agradar a ambos, desagradar aos dois: como não sei até que ponto o Professor Doutor Adriano se revê neste volume, se o elogio, posso, porventura, desagradar-lhe, se o critico, desagradarei a ambos. Ainda por cima eu não sou aqui nada nem ninguém, ao pé de quem o escreveu, e muito menos ao pé daquele que é o seu tema. Mas creio bem que andarei certo se adoptar como metodologia de crítica, neste caso não apenas literária, a mesma que o livro contém como tendo sido a que norteou as decisões de vida do Homem nele retratado. Assim, procurarei dizer apenas aquilo que em consciência estiver certo, sem qualquer preocupação de agradar ou desagradar seja a quem for e com a finalidade única de que a virtude fique no seu lugar. Em tudo o mais, cumprirei com desvelo o imperativo que me ditava o meu Pai quando eu, com nove ou dez anos, tendo que preencher algum lugar na mesa do King, inchadíssimo por ocupar a cadeira de alguém muito mais velho do que eu, me punha a opinar sobre as jogadas deste ou daquele. Aí, o meu Pai me dizia com indesfarçável tom de voz: “o cavalheiro reduza-se à sua insignificância!” É o que farei, cingindo-me, pois, ao que aqui nos traz.

Dizia eu que estamos perante um grande livro: são quase quatrocentas páginas de dados, de descrições e de inserções em contextos históricos, escritas com uma preocupação pela fundamentação das afirmações nele contidas, académica e rigorosa. Só notas de rodapé são mais de oitocentas! Mas não se pense que são estes números que tornam o livro grande, nada disso. O que o torna grande é, antes de mais, o seu tema e é a forma como se encontra estudado e redigido para apresentação ao leitor. É um livro grande porque em todas as suas linhas se nota um sem número de escrúpulos: escrúpulos em dizer a verdade; escrúpulos em não dizer nem de mais nem de menos; escrúpulos em não ferir susceptibilidades e escrúpulos em não atraiçoar, por causa dos mesmos escrúpulos, a finalidade de uma biografia. Grande, porque não está escrito para bajular nem para agradar a gregos ou a troianos mas para testemunhar, para ser um instrumento de transmissão de conhecimento e de preservação da memória.

A técnica utilizada, para nos fazer agarrar a toda a vida que pulsa no texto, tem um trabalho enorme por trás: o autor, para lá do seu texto original escrito num estilo limpo de bom português, seguindo a gramática que usa vírgulas e põe acentos, utiliza colagens de textos do biografado como recurso de escrita. Muito bem, me dirão. Mas eu digo-lhes que dizer “muito bem” é pouco, porque para isso, para fazer a selecção dos parágrafos a utilizar, para ter escolhido os representativos para o ponto de vista que, em cada capítulo e sub-capítulo, nos quis apresentar, tal significa que foi feito um esforço imenso de leitura, anotação e selecção que deve ter ocupado milhares de horas! Esta biografia não se fica, pois, por um ensaio árido sobre o objecto de estudo. Esta biografia é um exercício antológico do pensamento do Professor Adriano Moreira. É uma mistura de biografia propriamente dita, de memórias e de preocupação pedagógica em utilizar o testemunho da vida retratada como fonte de sabedoria para as gerações presentes e futuras.

A história poderia ter sido de outra maneira? É uma pergunta que percorre os bastidores em que estamos a assistir ao desenrolar de uma vida, desde Grijó a Lisboa, de Campolide à Rua da Junqueira, do Aljube ao Ministério do Ultramar, de Angola ao Brasil e a todo o Mundo. Há Portugal em todo o Mundo e o sangue que dá vida a este livro pode bem chamar-se Portugal! Porque foi esse sangue que animou e é esse sangue que anima, o sangue da Família Portuguesa, a vida do Professor Doutor Adriano Moreira.

Vida e obra de um grande português: não está escrito à distância indiferente de quem arruma a cronologia e expõe um curriculum. Está escrito página a página com o entusiasmo de quem aderiu e adere, de quem quer ver o leitor arrebatado por essa vida e por essa mesma obra. Arrebatado em nome de quê? Em nome do tenaz esforço que é preciso para a preservação da nossa Identidade, dos valores da Pátria e da Família, da sucessão dos factos, decisões e contingências que implicam toda uma vida. A roda e o eixo, em que o eixo são esses valores, imutáveis, sejam quais forem as voltas que a vida faça dar à roda!(3)

São sempre possíveis muitas leituras para um mesmo livro e este não foge à regra. Mas há uma leitura, dentre as demais, que é indispensável que aqui se faça e se diga. A sua leitura política. Quem o fizer, limpo de espírito e capaz de ser portador de um ideal, deparará com uma lição de política, sim. A de que a política, o serviço a favor da polis, deve sempre ser praticada como promoção do Bem-Comum e não como a conquista do poder para interesses particulares.

Este livro é uma contribuição para a História, uma contribuição benévola mas valiosa. A história tem sempre protagonistas e espectadores, uns e outros nos seus papéis de portadores dos testemunhos. Ao lermos factos e termos a percepção dos seus actores (aqui alinhados com um fio condutor que os faz ver com outra clareza e com uma perspectiva, nalguns casos, surpreendente), ficamos mais gratos por termos chegado até aqui e, sem dúvida, por termos tido o privilégio de, hoje, nesta sala, termos podido estar no mesmo local e hora em que estão também dois protagonistas tão especiais dessa mesma História. No fundo, ao percorrermos os treze capítulos em que nos é dado poder participar do que foi e é o pensamento e a acção de um grande português, ficamos com a sensação de que todos acabamos por estar empenhados nesta corrida que nos coloca num determinado espaço e num determinado tempo à procura de um sentido para a nossa própria existência e também de “saúde e dinheiro, já que Deus não nos pode dar tudo!”.

Finalmente, mas antes de me reduzir à minha insignificância, meu caro Doutor Manuel Vieira Pinto, devo dizer que, quando cheguei ao fim do livro, me veio a ideia de que o meu amigo corre o risco sério de que seja classificado academicamente pelo Professor Doutor Adriano Moreira. Não sei que nota lhe dará. Mas tenho a certeza que, no mínimo, tem garantida uma ida à oral, se é que não mesmo uma dispensa. É que a prova escrita, esta prova escrita está, sem dúvida, muito bem!

Manuel Cardoso

Grijó, 11 de Dezembro de 2010

1- Ver sobre este tema de biografias o prefácio de Maria Filomena Mónica em Vidas, Alêtheia Editores, Lisboa, Abril de 2010.



2- DG Edições, Linda-a-Velha, ©2009 M.Vieira Pinto e DG Edições, 1ª edição Outubro 2010, ISBN 978-989-8135-55-1.


3- O Professor Adriano, nas suas palavras de agradecimento e comentário feitas a seguir a ter-me ouvido ler este texto, explicou que esta imagem da roda e do eixo o tem acompanhado toda a vida desde que na juventude leu um livro, um romance de Morgan, intitulado Sparkenbroke, que o marcou.

terça-feira, 4 de maio de 2010

A Paula e o António

Há uns tempos, depois de mais um Câmara Clara, escrevi um artigo sobre um tema tratado. Apetece sempre escrever qualquer coisa depois de se ver o Câmara Clara...

É impossível ficar indiferente à voz e ao olhar da Paula Moura Pinheiro. Captam-nos a atenção desde o primeiro instante como se nos perseguissem. De tal modo que agora, ao ler seja o que for de PMP, nas linhas parecem estar, escritos como marca de água sub liminar, os símbolos do som de toda a força desse seu olhar e dessa sua voz. Digamos que dão mais força aos seus argumentos!

Tal como era impossível, no século XVII, ficar indiferente ao que pregava o Padre António Vieira. Não conhecemos dele a voz, nem o olhar, nem o gesto. Mas conhecemos a força do seu testemunho, o valor dos seus argumentos, a importância de tanta persistência na “perseguição do seu objectivo celeste” (para usar uma expressão de PMP). Há uns anos, em Lisboa, no Cinema Roma, numa concorrida sessão de homenagem da Casa de Trás-os-Montes ao Professor Doutor Adriano Moreira, um actor emprestou a voz, uma belíssima voz, para o Sermão de Santo António aos Peixes. Foi magnífico poder ouvi-lo à beira do palco como se o fosse da balaustrada de um púlpito. A voz de Vieira poderia ser diferente mas ali, entoadas daquela maneira, as frases que nos fazem humilhar a ponto de reconhecermos não prestar para sermos o sal da terra e que ao mesmo tempo nos fazem crescer para querermos mesmo e muito ser esse mesmo sal da terra, foi como se Vieira, ele próprio, nos interpelasse com força e determinação.

O ponto de vista feminino, sempre para lá da lógica da análise e muito melhor do que a lógica da análise, vê até onde esta não chega: o fundo dos corações, o valor emocional de um argumento. Para descobrir facetas de um homem, não há, pois, como uma mulher. Daí que tenha sido com uma enorme curiosidade e surpresa que li o artigo de PMP sobre o Padre António Vieira escrito na Brotéria, uma síntese no âmbito do Encontro Fé e Justiça, realizado em Lisboa em Fevereiro, sob o tema “Padre António Vieira: os mesmos desafios quatro séculos depois”.

Tal como Vieira “nunca vacilou na perseguição do seu objectivo celeste”, também PMP se mostrou convicta na incansável militância de S.Paulo em afirmar que “Não há judeu nem grego, não há escravo nem livre, não há homem nem mulher…”.

Espero sinceramente que PMP nunca deixe de nos perseguir nesta descoberta da verdade pela voz – que digo eu? – pelos sermões e pela vida do nosso Padre António Vieira.