domingo, 7 de agosto de 2011

A SERRA DE BORNES

Iniciamos a publicação de uma série de artigos que têm estado a sair mensalmente n'O Comércio de Macedo, sobre a Serra de Bornes. Este foi o primeiro.

A Serra de Bornes vale mais do que um artigo. E vale bem. A sua silhueta é inconfundível, cheia de carácter, o perfil de uma mulher deitada para os mais poetas. Dizem os peritos que geograficamente é uma montanha. Sê-lo-á. Montemé chamavam-lhe os antigos, Montoio diziam ser o nome da parte mais baixa, que desce para Caravelas, Cedães e Vale de Asnes. Serra de Chacim era o nome de quem a via a partir de Balsamão. Serra de Soeima, para quem a vê de Sul, do vale profundo da Ribeira de Zacarias. Para nós, mesmo no século XXI, é a Serra de Bornes!


As memórias antigas também a dão povoada de javalis e corços, tal como agora a conhecemos. Couto de lobos (de poucos lobos, infelizmente…) nos vales que a sulcam, com guarida certa nas matas de carvalhos e castanheiros que a cobrem de forma magnífica. O colorido da serra está nestas matas e nos tons das encostas, de um verde cambiante misturado com a cinza dos troncos dos carvalhos, e das folhas profundas dos castanheiros com mais verde e vermelho-fogo, no Outono. Quem nunca experimentou o que é andar nestas matas quando a folha está prestes a cair, não experimentou a sensação incrível de se embriagar de cores e dos cheiros fortes que a natureza dá. Cores com cheiro - e sem ser de flores. Matas em que se pode andar também agora, na Primavera, com os rebentos a querer brotar, com a seiva a despertar para a pujança da serra.

Quando se vai de Carrapatas para os Cortiços e se olha para a serra, vê-se mudar de cor com o andamento do carro e com as horas do dia. Vê-se mudar. Há dias em que parece mais perto, outros mais longe. Desafia a observação e alimenta a imaginação. Tal como de manhã, ao descer-se de Latães em direcção a Macedo, a serra parece comungar da nossa pressa em começar o dia. As ventoinhas aceleram a essa hora. O seu contorno ergue-se acima da bruma da manhã que corre no vale, misturada com o fumo das lareiras a acender-se. Castelãos, Vilar, Grijó, Vale Benfeito e Bornes aparecem a essa hora como uma pincelada de um pintor desatento, garatuja feita a traçar estradas e obras.

Para lá de tudo o que se possa pensar, a serra consegue surpreender-nos. Uma tarde, ao vir de Espanha por Vinhais, ainda longíssimo, de repente, sem contar, quem é que aparece lá muito ao fundo, no horizonte, cinzenta-azulada a espreitar sobre os montes mais próximos? E de outra vez, no fundo da veiga de Chaves, decididos a ir ao castelo de Monforte do Rio Livre, quem é que vemos num recorte nítido, quase tão azul como o céu, sobre o castanho dos montes do planalto? Ao percorrer-se o planalto de Carrazeda, o chão da Vilariça, as encostas do Reboredo ou o planalto de Mogadouro e Miranda, quem se impõe omnipresente, correndo lá longe onde a vista alcança?

O emprego feito acima da palavra “quem”, é porque a sua presença é mais do que a dum mero acidente físico, é a duma entidade que há milénios pontifica no centro da nossa região. Não seria compreensível o nosso espaço sem a Serra de Bornes. Tal como em tempos terá dividido povos, hoje marca o território, chamando a atenção com os seus 1212 metros com uma serenidade familiar de quem quer ter à volta uma família de gente.

À hora do por-do-sol a serra não desaparece. Brilha na obscuridade, noite dentro. Então hoje em dia, com as luzes das eólicas, afirma bem a sua existência. Mas abstraindo desses flashs brancos e vermelhos, brota luar de dentro de si, fica prateada em Janeiro, em noites de geada, fica prateada em Julho e em Agosto, nas noites em que o calor a envolve.

A Serra de Bornes vale mais do que um artigo, pois vale. Iremos falar da Serra de Bornes nos tempos mais próximos!

2 comentários:

LS disse...

Boa, Manel
Fale-nos de Bornes, sim. Peço-lhe que acrescente mesmo algo mais ao que já foi publicado, como uma que me contou. É um enrugamento desgastado mas que se rodeou de vales que lhe dão majestade incontroversa. Penso que algo controverso é o conceito (debitado por um filósofo local) das ventoinhas provocarem agora um ventania no topo que lhe tirou amenidade, mas ele lá sabe...
Abraço.

manuel cardoso disse...

Essa das ventoinhas tirarem amenidade fez-me logo lembrar de um técnico(?!) que me explicou como enxugam por evaporação os pôlders da Holanda sob a acção dos moinhos!... Abraço!