Em Elvas, em Abrantes, em Torres Novas, em Montemor ou em Évora e noutras cidades e vilas do Sul, havia em cada uma um ponto fulcral de discussão e acerto. Em Trás-os-Montes, há meio século, era no círculo do Mira, do Paulino, da Caixa Geral de Depósitos e das esquinas do pequeno largo da Pensão Praia, em Mirandela, com um vai-e-vem de atravessar a rua no meio do trânsito (passavam ali mais de metade dos veículos do Distrito!), que entre lavradores, negociantes, informadores do Cachão, candongueiros, chapéus, apertos de mão e samarras, ao frio, vozes e olhares, sob sombreiros abertos se a chuva insistia, se fazia, nas últimas feiras do ano, definitivamente na de 23 de Dezembro, o preço da azeitona da Terra Quente. Os vidros embaciavam e o fumo do tabaco, misturado com o vapor das máquinas de café, davam uma atmosfera de lagar ao Mira e ao Paulino, a que as botas acrescentavam o cheiro. À mesa ou em pé, ao longo da manhã, fechavam-se negócios, com argumentos da funda que constava que já tinham dado os bagos dos olivais de S. Pedro ou dos do Cabral de Guribanes, que em Abreiro isto ou na Torre aquilo, ou com mitos de compradores fantasma. Havia alguns pequenos lagares que já moíam desde a Santa Catarina e as filas para descarregar nas Cooperativas e no Cachão já se iam formando no seu ritual anual (que com estas o preço era outro, o rendimento só no fim da safra se determinava por médias e os escudos e tostões só eram fixos quando o azeite saía, às vezes mêses após, podendo os lavradores por conta ir levantando produtos para grangeio ou alguma importância para despesas prementes).
Com os lagareiros, o dinheiro começava logo a girar. Em Macedo havia dois, três e quatro preços diferentes, conforme: o Cóque adiantava, às vezes ainda antes do Natal, simpático, em preços fixos por baixo, em notas, conversadas no Café Central, sobre olivais de que sabia os rendimentos de memória de campanhas passadas; o Artur Moreno era mais circunspecto e, até, quase secreto nos complexos negócios de acertos de contas para os quais a azeitona era apenas o lastro ou a garantia; os de Castelãos, de Chacim, dos Olmos, de Lagoa, de Vinhas, de Peredo, do Lombo, de Morais, de Talhas, dos Cortiços, tantos outros, valiam-se da premência dalguns proprietários em traduzir em metálico a sua melhor azeitona, levando a outra para as tulhas das Cooperativas ou do Cachão. E notava-se que o dinheiro já corria em sentido inverso ao do azeite quando a afluência e o tom ficava mais animado nas vozes no Germano, no Flórida ou no Tótó, no Campos de Vila Flor, no Saldanha de Peredo ou no Montemel em Macedo. Coisa algo diferente mas também parecida era o que se passava em Alfândega, em Moncorvo, em Freixo, em Mogadouro, onde os primeiros valores eram sempre díspares por causa dos negócios em grande de casas maiores mas, depois, ao terminar o ano, vinha o diapasão da feira de ano, fazendo eco no Montanha ou no Central de Moncorvo: em Mirandela corre a tanto! E, a partir daí, o valor da safra deixava a discussão dos lavradores e passava mais para a dos azeiteiros e negociantes de grosso trato.
1 comentário:
Manuel,
Bem descrita a safra da azeitona e do seu escoamento. Ouro para a nossa região e levada para tudo quanto é sítio pela excelência da sua qualidade.
Havia comerciantes que vinham de Oliveira de Azeméis comprar azeite aqui a Mirandela. Nos anos 50 e 60, havia um que comprava muito azeite. O seu nome era Eduardo Correia da Silva. Era o meu pai que lhe indicava os produtores.
Também ainda é presente uma construção, onde funcionou um armazém de mercearias, em frente à velha moagem de S. Sebastião, que era propriedade do Porfírio de Morais, que negociava muito azeite da nossa região. Chegava a ter nesse local muitas dezenas, senão centenas de bidons de 200 l.
Os velhos lagares em Mirandela, no S. Miguel, na rua do Rosário, na subida para o Bairro Operário e por trás do actual Continente eram alguns sinais de produção na nossa terra.
Depois, as dezenas de lagares existentes nas aldeias do concelho, que permitia a obtenção de vários tipos de azeite devido ao processo de fabricação.
Um abraço
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